AMOR DE DEFICIÊNCIA
AMOR DE DEFICIÊNCIA
Helci Rodrigues Pereira
“Em última análise, precisamos amar para não adoecer”.
Sigmund Freud
É interessante a distinção proposta por Abraham Maslow entre amor de deficiência e amor do ser. Amor de deficiência seria aquele causado pela necessidade, seja de auto-estima, de sexo, de medo da solidão, etc., que se intensifica e cresce à medida em que a pessoa é gratificada. Quer dizer, o amor de deficiência é o amor que alguém tem por outros que satisfaçam suas necessidades - tipo mui encontradiço. É um amor muito possessivo, até egoístico.
O amor do ser é o amor pela essência, pelo ser do outro. É um amor não-possessivo, concentrado mais no bem do outro do que numa qualidade pessoal; é um amor de tal nível que consegue deixar a coisas serem como são, consegue apreciar o que são sem interferir nelas, sem querer melhorá-las. É um amor desinteressado, que nada exige em troca, que tem como recompensa o próprio ato de amar, de apreciar a beleza do objeto amado. "É uma capacidade em expansão contínua, que culmina na convicção, no reconhecimento de que nada há no mundo ou no espírito que não seja ao mesmo tempo amado e amante" (Rumi, poeta persa).
Amor-fundamento da vida - Arnold Toynbee (1889), historiador inglês, londrino, universalmente conhecido pelos seus estudos comparativos das civilizações, preceituara: "...o amor dá à vida finalidade, significado e valor que não podem ser encontrados, ao menos na vida humana, quando esta é vivida para si" (Experiências).
Os estudiosos do comportamento, os cientistas da vida, ensinam o que a Palavra de Deus tem pontificado sobre nossa temática: O amor torna a vida digna e preenche sua destinação, seu objetivo. Toynbee chega a asseverar, com alta dose de razão, que, sendo a finalidade da vida recheada pelo amor, essa realização não será, de forma alguma, desfeita nem pela morte que põe termo à vida. Destarte, o amor é mais poderoso do que a morte, de tal forma que a morte só dá a última palavra se houver renúncia do amor porque, então, ficará a vida privada de finalidade, sentido e valor, o que pode significar a morte da vida.
Amor-necessidade psicológica - Sim, o amor é uma necessidade psicológica significativa, dado o seu importante valor no desenvolvimento normal da pessoa. A criança precisa do amor dos pais e os pais dos filhos para a satisfação das necessidades recíprocas. Corrobora com tal assertiva o fato de que crianças que tiveram de ser hospitalizadas por longo período se debilitaram face à não satisfação de sua sensibilidade interna, de sua carência filiativa, por causa da constante quebra de sua homeostasia. Por tal razão é que os hospitais modernos permitem que os recém-nascidos permaneçam no quarto com suas mães.
O amor é considerado "fenômeno-chave no desenvolvimento autônomo do indivíduo moderno, aquele que põe em causa a própria essência da liberdade do indivíduo" (Psicologia Social, Jean Stoetzel).
Carl Rogers, citado por Fadiman e Frager (Experiência, de Toynbee) coloca o amor como uma "consideração positiva" de que o ser humano necessita desde o momento em que toma consciência do seu "self" e, diz Rogers, "esta necessidade é universal, considerando-se que ela existe em todo o ser humano e que se faz sentir de uma maneira contínua e penetrante".
O amor é de tal monta indispensável em nossa vida, máxime na criança em formação, que nós somos guiados menos pelo caráter agradável ou desagradável de nossas experiências e comportamentos do que pela necessidade de afeição que aquelas experiências e comportamentos encerram. Quer dizer, face ao desejo de ser amado muitas vezes nós podemos chegar a agir contra os nossos próprios interesses, contanto que os nossos comportamentos, agradáveis ou não, nos garantam amor ou aprovação daqueles a quem muito queremos.
Helci Rodrigues Pereira é Pastor, Advogado, Professor,Escritor e também autor dos livros "Pastorais", "O Ser Humano - Reflexões" e "Expressões do Recôndito".