DELINQÜÊNCIA JUVENIL E FAMÍLIA

DELINQÜÊNCIA JUVENIL E FAMÍLIA
Helci Rodrigues Pereira

Em geral, a atmosfera familiar contribui bastante para o entretecimento do delinqüente

Todo o tipo de delinqüente de que se possa tomar conhecimento, de uma forma ou de outra, mediata ou imediatamente, atual ou remotamente, tem como causas de sua delinqüência fatores bio-psíquico-econômicos de uma sociedade NEUROTIZADA E NEUROTIZANTE.

Seja o criminoso que pratica o delito sem participação do “ego”; seja o delinqüente neurótico, cujas ações estão neuroticamente condicionadas por falha dos mecanismos inibitórios do seu “superego”; seja aquele que age sob pressão de tendências inconscientes, caracterizado por um “querer indireto” ou “querer inconsciente”; seja o que age sob o impacto de violenta emoção, como nos crimes passionais: todos os que  DELINQÜEM, os que assumem uma posição anti-social agressiva, foram preparados, direta ou indiretamente, pelas estruturas sociais desumanas favorecedoras dos desajustes, dos desequilíbrios e dos delitos humanos, de tal forma que, afinal, a grande delinqüente é a própria sociedade. E, sendo a sociedade, no dizer de Ruy Barbosa, a “família amplificada”, resulta daí a sua importância como variável no assunto.

À baila o respeitável pronunciamento de STANFORD:

“A maioria dos psicólogos concordariam que os fatores sociais são determinantes significativos de nossos traços de personalidade e, como o primeiro dentre eles, vem a família. Uma atmosfera adequada no lar, com boas relações entre os pais e a criança, é quase essencial ao desenvolvimento de personalidade bem ajustada. Estudos anteriores de lares desfeitos fundamentam esta teoria. CYRIL BURT, psicólogo inglês, descobriu que 58% de delinqüentes que observou provinham de famílias divididas pela morte, pelo divórcio ou por ausência dos pais. Somente 25% de crianças não-delinqüentes, de ambientes comparáveis, eram produtos de lares desfeitos. Estudos posteriores chegaram à mesma conclusão, embora os resultados não sejam sempre tão marcantes (...) HORNELL e B. HART, sociólogos, defenderam que o antagonismo constante entre pais desintegra a personalidade de uma criança”.

AUGUST AICHORN, psicólogo vienense, nos informa que as crianças de sua instituição para delinqüentes vieram, quase que exclusivamente, de lares desintegrados e desarmoniosos.

A psicóloga infantil BERTA W. HARTWICK verificou que as crianças pré-escolares oriundas de lares bem integrados e felizes se comportavam cooperativamente e manifestavam equilíbrio emocional e bom ajustamento.

PAULO GUSMÃO DOURADO, em seu Manual de Sociologia, corroborando com esta posição relativa à importância no favorecimento ou não das tendências desviantes, até delinqüentes, escreveu:

“ ... O abalo sofrido pelos valores familiares (...) os divórcios, as separações de fato, os novos lares de casamento sem base legal, socialmente tolerados e reconhecidos, os conflitos de gerações, a ausência de mãe no lar por motivo de trabalho ou por abandono do lar, muitas vezes para construir outro, os conflitos entre esposos ou entre concubinos, manifestados, na maioria das vezes, na presença dos filhos, a televisão, roubando o tempo do diálogo entre pais e filhos, TODOS ESTES FATORES se refletem negativamente sobre a personalidade dos filhos, abrindo a porta para a DELINQÜÊNCIA, para os protestos e as fugas nas drogas ...”

Pesquisas sociológicas feitas em Nova Iorque, ainda em 1950, detectaram os seguintes elementos com respeito à relação FAMÍLIA e DELINQÜÊNCIA:

1º - “Os lares desfeitos são mais importantes como origem de crimes entre as meninas do que entre os meninos”;

2º - De 322 meninos, 81 tinham sido condenados por delitos como furto e roubo, e os restantes por delinqüência sexual. Desses, 44% tinham vindo de LARES DESFEITOS; 

3º - O interesse ambiental “predispõe a delinqüência com reação neurótica,  acompanhada, por vezes, de sintomas psiquiátricos. A delinqüência no indivíduo que não esteja sob tensão estaria mais associada à anormalidade de personalidade”.

Não podemos, portanto, olvidar que a família é o cadinho no qual se desenvolve uma personalidade. 

Um estudo de 288 meninos e 35 meninas, na Grã-Bretanha, que tinham sido considerados oficialmente delinqüentes, revelou que seus pais não cuidaram bem do uso dos serviços médicos e sociais disponíveis; viviam em condições habitacionais indesejáveis e mostravam pouco interesse no preparo educacional dos filhos.

Lamentavelmente, constatamos que os estímulos no lar raramente têm sido inspiradores e construtivos. Por trás do delinqüente, em muitos casos, não em todos, está a família que não soube transmitir aos seus filhos os verdadeiros valores da vida e permitiu que essas crianças enchessem suas mentes, suas almas com ilusões, fantasmas, emoções mórbidas e libidinosas, sem qualquer relação com a realidade. Com isso, não ousamos dizer que de lares de influências positivas não saiam crianças que se venham a tornar delinqüentes por outros motivos e experiências de vida. Para compreendermos como se fazem alguns tipos de delinqüentes, na maioria dos casos, temos de partir das atitudes das gerações adultas em relação às mais jovens.

LAURO BRETONES, articulista de escol, de uma revista paulista já esgotada e não mais editada – UNITAS, em trabalho intitulado “COMO VAI A FAMÍLIA ?”,  nos apresenta alguns pronunciamentos de delinqüentes, que trazem luz sobre o fato da influência e responsabilidade familiar na delinqüência juvenil. Vejamos alguns:

“ONTEM TIVE A MAIOR AVENTURA DE MINHA VIDA!” - Estas foram palavras de um adolescente dirigidas à polícia, logo após a perpetração de seu primeiro “crime”. Ele, que não recebera da família estímulos para experimentar aventuras construtivas e sadias, considera seu ato delituoso uma “suprema aventura”.

“NÃO TIVE O AMOR QUE UMA CRIANÇA DEVERIA TER TIDO!” - Palavras de um Adolescente-delinqüente que foi, no recesso do lar, um carente de amor, um necessitado do afeto que só se pode experimentar num lar harmonioso.

“MEU PRINCIPAL MOTIVO PARA ROUBAR ERA O DESEJO DE FAZER ALGUMA COISA” Quantos adolescentes, hoje, sofrem as conseqüências de terem tido tudo sem precisar fazer qualquer esforço! Aprenderam a encontrar tudo pronto. Tudo para eles era ócio e lazer. Esse tem sido, sempre, um bom caminho para se produzir vidas desajustadas.

“NINGUÉM ME QUER!” - Eis aí o drama íntimo e o retrato de toda a tragédia do menor abandonado! Referimo-nos ao abandonado que perambula pelas ruas da cidade, sem teto e sem amor, e ao abandonado dentro de casa, tendo, talvez, tudo, menos atenção e afeto, sentindo-se, destarte, infeliz. A psicologia da canção popular já proclamava: “não é só casa e comida que faz a mulher feliz. 

Amor é uma necessidade. Sua falta pode causar um desastre na vida de uma pessoa.

Quem sabe, a criança ouviu tantas vezes: “você não presta!”; “você nunca vai ser nada na vida!”; “você é um malandro!”; “você é um relaxado!” que termina por se convencer, e o sendo na realidade.

Um outro adolescente saiu-se com essa exclamação: “Oh! Se algumas pessoas nos tivessem aconselhado em lugar de martelar nossas cabeças...!”

É o lamento que vem do escrínio, do âmago, do mais profundo de um adolescente-delinqüente. O adulto usa seus critérios e exige tal ou qual comportamento da criança. E martela na sua cabeça. Exige que ela aja “como adulto”, não lhe perdoando qualquer deslize ( mas nem sempre lhe dá exemplo congruente ) e, como martelo, cai sobre o faltoso e o incrimina. Desta forma, entre gritos histéricos de repreensões e censuras, cresce o candidato à delinqüência, que se revolta contra os seus próprios produtores ou forjadores. 

As estatísticas, em todo o mundo, confirmam a responsabilidade dos pais e do ambiente sócio-familiar no desenvolvimento da personalidade. Um estudo especial sobre a matéria, realizado numa grande universidade norte-americana, revelou que 60% dos menores delinqüentes têm pais que bebem excessivamente; 75% experimentaram a permissividade. Aprenderam a fazer e fizeram o que quiseram; 60% são oriundos de lares com grande desarmonia interna; 70% têm pais que não se interessam pelos seus amigos;  80% queixam-se da indiferença da mãe; 60% reclamam da apatia dos pais. Muitos provêm de lares totalmente destruídos. Poucos receberam qualquer orientação espiritual/religiosa. 



Helci Rodrigues Pereira é Pastor, Advogado, Professor,Escritor e também autor dos livros "Pastorais", "O Ser Humano - Reflexões" e "Expressões do Recôndito".

Pesquisar no site